Sunday, May 2, 2010

INDIELISBOA'10: prémios e algumas críticas

Está a chegar ao fim o festival de cinema independente da cidade de Lisboa. Os prémios foram atribuídos na última noite e, do que tive a oportunidade de ver (o que não foi muito, infelizmente), o balanço é positivo.

Curtas das quais gostei particularmente: I Love Luci, Ella, Tigre, Dreams From the Woods, La Harde.

Au Voleur (dir., Sarah Petit, França, 96')
Bruno (Guillaume Depardieu) é um ladrão amador que se envolve numa relação com uma professora, Isabelle (Florence Loiret Caille), ligeiramente frustrada com o rumo que a sua vida e a sua carreira estão a levar (a mediocridade da "Substituta"). A certa altura, a polícia corre atrás de Bruno e o casal foge para uma floresta, onde, passando por sítios muito bonitos, vivem umas férias quase perfeitas - têm até comida, que roubaram de uma casa nos arredores. A dificuldade surge perto do final, quando se atrevem a ir a uma festa popular e Bruno é reconhecido por um polícia, iniciando-se um tiroteio que acaba com a morte do segundo e com os ferimentos do primeiro. No final, Isabelle consegue salvar o seu homem, deixando-o estendido no chão enquanto chega a ambulância e foge, a pé, a andar. Está engraçado.

The Robber (dir., Benjamin Heisenberg, Alemanha/Áustria, 97')
A história de Johann Retenberger (Andrea Lust) que, acabado de sair da prisão onde se entregou a uma intensiva preparação física, se entrega ao roube e à maratona. Ao mesmo tempo que assalta bancos, a certa altura apenas por adrenalina, bate o record nacional da corrida dos 42km e tem um caso com Erika (Franciska Weiz). Tudo vai por água a baixo quando Johann, no final de mais uma das suas corridas, assassina de forma não premeditada um comissário encarregue de escrever os relatórios sobre a sua reintegração na sociedade. Ao mesmo tempo, Erika descobre que o namorado é o responsável pelos mediáticos assaltos a bancos, que têm vindo a ocorrer nos últimos tempos. O atleta é preso, consegue fugir e corre sem parar durante horas e horas a fio, acabando por roubar um carro e se fazer à estrada. Porém, uma facada que sofreu quando ainda estava a mote a pé, acaba por ser fatal, em plena autoestrada.
O conceito e os traços gerais da estória tinham tudo para dar um excelente filme. Desiludiu-me, porém. Assistimos, basicamente, a uma correria incessante (quer seja em provas, quer seja a correr do banco para o carro). O próprio actor foi-me indiferente.

Le jour ou Dieu est parti en voyage (dir., Philippe Van Leew, França/Bélgica, 100')
A localização espacio-temporal é a dos terríveis massacres do Ruanda. Jacqueline (Ruth Nirere), numa interpretação de tirar o chapéu, trabalha numa casa de uma família francesa, que consegue fugir, ajudada pelo exército. Nirere esconde-se em casa, assustada, enquanto ouve os rebeldes entrarem e destruírem tudo o que podem, acabando fugir, na manhã seguinte. A partir daqui, é a estória de uma mulher fugida e perseguida, que se esconde numa floresta, onde encontra um homem ferido, na mesma situação que ela. Trata dele (de forma muito pouco ortodoxa - quer dizer, com os recursos que tem) e juntos vivem quase como marido e mulher durante vários dias, sobrevivendo de caça rudimentar, sementes e água de um pequeno riacho. Raramente trocam uma palavra. A certa altura, passamos a assistir a um retrato da loucura a que Jacqueline não conseguiu fugir, um retrato perfeito de toda uma época, num final tocante, de entrega à submissão. A pergunta que fica no ar é "O que farão com ela ?".

10 to 11 (dir,. Pelin Esmer, Turquia, 110')
Uma ficção semi-biográfica (a personagem principal é o tio da realizadora; o próprio actor interpreta-se a si próprio) de um homem, Mithat Esmer, que vive obcecado em coleccionar tudo, na bela cidade de Istambul (como dizem as críticas, esta é a "verdadeira personagem principal"). Certo dia, depara-se com o obstáculo da sua vida: o seu prédio terá de ser demolido. Enquanto que todos os seus vizinhos já se estão a mudar, Mithat, qual velho do restelo, recusa-se firmemente a abandonar o seu barco - enquanto isso, numa propositada indiferença, quase ingénua, continua a sua colecção, sem que possa faltar sequer um único jornal do dia. Os diálogos de Mithat são soberbos e a interpretação (que recebeu uma menção honrosa) está fantástica. A fotografia é bonita.

Guerra Civil (dir., Pedro Caldas, Portugal, 90')
Saí da sala de cinema, inspirei e esbocei um sorriso. Foi revigorante ver que o cinema português sabe mesmo contar (bem) boas histórias. Durante o final do verão de 1982, Rui (Francisco Belard), um adolescente que tem de estudar para os exames de Outubro, vive fechado no seu eu - tem um rato de estimação, quase não fala para a mãe, não vai à praia, ouve música em altos berros, acompanhada de danças estranhas, e faz desenhos de mulheres nuas. Ao mesmo tempo, Joana, animada e descontraída, puxa por ele - dá-lhe nova música (Orange Juice, nomeadamente), enche-o de perguntas engraçadas e desconfortantes sobre a sua vida e os seus desenhos, leva-o até à praia. A rapariga dá-lhe todos os sinais; ele fica sempre de pé atrás. Ele gosta dela, ela quer ... bem, divertir-se. A insegurança e hesitação de Rui levam-no a aperceber-se de que Joana não está verdadeiramente interessada nele - numa festa, por não receber um beijo do nosso "autista", leva outro rapaz pela mão. Engraçado está o facto de Rui encontrar vários casais, ao ir atrás deles, mas nunca vemos quem ele quer. Ao mesmo tempo, a falta de atenção que o seu pai dá a sua mãe, leva-a a procurar a paixão num rapaz muito mais novo. Um escaldante caso de verão, que não termina quando o marido chega, assistindo e contribuindo para a deterioração daquela família, após tentativas frustradas de se aproximar do filho. A estruturação do argumento está particularmente deliciosa: a perspectiva de Rui, a perspectiva da sua mãe. Tiro também o chapéu aos três actores principais. Maravilhosa fotografia, excelente iluminação e banda sonora. O filme que mais gostei, dos que vi, deste Indie'10.


Prémios:

Grande Prémio Cidade de Lisboa

«Go Get Some Rosemary», de Ben Safdie e Josh Safdie (EUA)

Prémio de Distribuição Caixa Geral de Depósitos

«La Pivellina», de Tizza Covi e Rainer Frimmel (Itália/Áustria)

Prémio Tobis para melhor Longa-Metragem Portuguesa

«Guerra Civil», de Pedro Caldas (Portugal)

Prémio AIP/Kodak de Melhor Imagem para Longa-Metragem Portuguesa

«Sem Companhia», de João Trabulo (Portugal) – Fotografia: Miguel Carvalho

Menção Honrosa para Melhor Interpretação

Mithat Esmer, actor de «10 to 11», de Pelin Esmer (Turquia)

Curtas-Metragens

Grande Prémio Inatel – ex-aequo:

«Cocoon», de Till Kleinert e Tom Akileminu (Alemanha)

«La Neige Cache l’Ombre des Figuiers», de Samer Najari (Canadá)

Menção Honrosa

«La Harde», de Kathy Sebbah (França)

Prémio Media Recording para Melhor Curta-Metragem Portuguesa

«A History of Mutual Respect», de Gabriel Abrantes e Daniel Schmidt (Portugal)

Menção Especial

«Fuera de cuadro», de Márcio Laranjeira (Portugal)

Prémio Restart para Melhor Realizador Português de Curta-Metragem

Sandro Aguilar, por «Voodoo» (Portugal)

Prémio Novo Talento Fnac (para o realizador da competição nacional de curtas-metragens que se revele um talento emergente)

«Carne», de Carlos Conceição (Portugal)

Prémio AIP de Melhor Imagem para Curta-Metragem Portuguesa (Participação no XVIII International Film Festival of the Art of Cinematography, em Lodz, na Polónia):

«O Verão», de João Dias (Portugal) – Fotografia: Daniel Neves

Prémio RTP 2 Onda Curta

«Enterrez nos chiens», de Frédéric Serve (França)

«Cyclist», de Marc Thuemmler (Alemanha)

Prémio do Público para Melhor Longa-Metragem

«Pelas Sombras», de Catarina Mourão (Portugal)

Prémio do Público para Melhor Curta-Metragem

«Cities on Speed: Bogota Change», de Andreas Mol Dalsgaard (Dinamarca)

Prémio Fipresci

«Castro», de Alejo Moguillansky (Argentina)

Menção Honrosa

«Au Voleur», de Sarah Leonor (França)

Prémio RTP Pulsar do Mundo

«Les Arrivants», de Claudine Bories e Patrice Chagnard (França)

Menção Honrosa

«Barbe Bleue», de Jeanne Gailhoustet e Anne Paschetta (França)

Prémio Amnistia Internacional

«Les Arrivants», de Claudine Bories e Patrice Chagnard (França)

Menção Honrosa

«Ilha da Cova da Moura», de Rui Simões (Portugal)

Prémio Signis – Árvore da Vida

«Pelas Sombras», de Catarina Mourão (Portugal)

Menção Honrosa

«Nenhum Nome», de Gonçalo Waddington (Portugal)

Prémio IPJ para o melhor filme da secção IndieJúnior

«The Six Dollar Fifty Man», de Louis Sutherland e Mark Albiston (Nova Zelândia)

Menção Honrosa

«Plank», de Billy Pols e Liedewij Theisens (Holanda)

Menção Honrosa

«Jacco’s Film», de Daan Bakker (Holanda)

Prémio do Público IndieJúnior Pais & Filhos

«Summer Wars», de Mamoru Hosoda (Japão)

SAPO/IndieLisboa

1 comment:

  1. Tenho mesmo pena de estar tão inundado em exames e trabalhos porque já faltei a 3 festivais, ao Fantas, a este Indie'Lisboa e ao Black & White. Ai enfim.

    Vou ver se ainda vou a tempo de arranjar alguns destes filmes para ver. O vencedor recebeu muito boas críticas, deve ser bom.

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