Thursday, June 17, 2010

I Girasoli / O Girassol (1970)


Começa com uma lindíssima fotografia sobre um imenso campo de girassóis aquele que é já um dos últimos filmes do mestre De Sica e aquele que considero ser um dos mais subvalorizados.
É entre Giovanna (Sophia Loren) e Antonio (Marcello Mastronianni) que se ergue um grande amor, exactamente a partir de um pequeno olhar, desde uma primeira brincadeira, aquecendo-lhes e fundindo-lhes os corações, levando-os a casarem-se, no início da II Guerra Mundial, para terem uns últimos 12 dias juntos (a licença de António). Por entre outras maquinações, de uma inocência e traquinices quase infantis, ou não fosse o cupido uma criança, o casal procura prolongar a sua estadia num leito comum, sem sucesso. O comboio, símbolo da partida, da distância e da chegada, não mais volta, nem tão pouco trazendo uma carta, uma breve notícia, mergulhando uma mãe e uma mulher numa agonia interior que quase lhes consome vida terrena. "Mas ele está vivo !", murmura Giovanna para si, para a sogra e para os outros. Enlouquecida, mas disfarçada por uma serena esperança, a mulher que um dia foi esposa parte para a Rússia (o primeiro filme estrangeiro filmado na URSS), terra de onde haviam chegado os últimos, únicos e amargos relatos sobre Antonio - morto de frio, gelado na neve.

Em contraste com a imponente praça vermelha, do comboio sai uma mulher magra, cansada, de semblante carregado, olhos que reflectem a balança da consciência procurando encher mais o prato da esperança do que o da mágoa perante o destino. Lá longe, tão longe, encontra o seu marido bem de saúde, vivendo com uma lindíssima mulher russa, de cabelos ruivos e olhos azuis, que empresta os traços a uma pequenina filha.

Tivesse Antonio morrido na guerra para que Giovanna houvesse guardado o seu amor para sempre e se soubesse amada do outro lado da fronteira da vida. Teria sido preferível. Volta para casa e partilha o sofrimento com uma mãe já velha a quem o filho também abandonou. O tempo passa. Antonio vem da Rússia procurando por perdão, defendendo-se com um assalto à sua memória e à sua consciência, de que havia sido vítima nos tempos em que havia sido salvo pela sua nova companheira, pretendendo voltar a Itália e re-declarando o seu amor.


Porém, traída por um destino aproveitador de um tempo de guerra, Giovanna tinha já, também, uma criança nos braços, cujo pai nunca chegamos a conhecer. Não precisamos. "Destruiríamos a nossa vida e a das crianças", diz Giovanna a Antonio. Um amor que um não um pode negar ao outro, demasiado forte para se esbater na traição mas ainda mais forte para que a mágoa, que lhe faz reflexo ao espelho, lhe conceda a virtude de ultrapassar os limites do perdão.

Uma estória agridoce, contada e mostrada de forma original e sensível, sobre um amor que poderia alimentar um caule de girassol ("Cada girassol cobre um soldado [morto]"), qual Tristão e Isolda - a eternidade.

No comments:

Post a Comment