Monday, January 10, 2011

Buried (2010)

E eis que surge, depois de SAW, há uns anos, aquela que é, ou tem de ser, a obra paradigma para qualquer cineasta português que se queira erguer da mediocridade em que estamos imersos, alguém que não tenha vergonha de esconder a ambição de fugir ao autismo, alguém que não só acredite como também saiba que o problema do nosso cinema não é o dinheiro mas sim a criatividade (nota: o dinheiro também é um problema, não o nego nunca).

Com um orçamento baixíssimo, o mesmo do fraco "Mistérios de Lisboa", Rodrigo Cortés fez, ao mesmo tempo que tudo que disse, o filme que Hitchcock gostaria de ter feito. Noventa minutos dentro de um caixão, nada mais, nada menos. Eu próprio não acreditava ser possível contar-se uma história destas e, no entanto, o que se fez aqui foi pegar numa grande ideia, num isqueiro, numa lanterna, nuns pedaços de madeira e fazer um dos filmes do ano.

E não precisa de ser um filme que se diz ser um filme do ano pela Cahiers ou afins, e em que entram filmes como "Morrer como um Homem", classificando de ignorante o espectador nacional (seria o espanhol; no nosso caso, o português), venerando o famoso "estrangeiro". Não, este é um filme que capta a atenção do espectador do primeiro ao último minuto, no retrato que protagoniza de uma claustrofobia imensa, com uma câmara que se mexe muito bem, de forma infinita, num espaço tão reduzido como aquele. Todos os planos utilizados têm uma significação própria essencial e perfeita, e de outra forma não seria possível ter sucesso com esta peça. Uma evolução dos mesmos conjuga-se à evolução da personagem, que entra numa luta (e nós com ela) cada vez mais perturbante entre o desespero e a esperança. A partir do momento em que a areia começa a cair, é tensão até ao fim. Foi até sentir que tinha acabado, à espera que alguém o tirasse dali. Aterrorizante, aprisionante, agoniante e ainda conseguiu estender o conflito e o tema à política e ética das actividade norte-americana no Iraque, nomeadamente no que toca à distinção entre a pessoa e o próprio Estado.

7 comments:

  1. Diogo, por mais que concorde contigo, penso que deves, nos teus textos e quando isso não se adequa (como é o caso), afastar o teu ódio de estimação que é o cinema português, que generalizas de autista e pretensioso e bla..., e tratar uma obra desta envergadura por si só, um sucesso de produção e de realização, na minha opinião.

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  2. Flávio,

    Antes de mais, não é ódio, é desprezo.

    Generalizo, é verdade. Mas faço-o porque é assim que vejo aqueles que apelidamos de "os grandes e incompreendidos realizadores portugueses, que apenas o estrangeiro valoriza". Em quantos blogs não viste, nas últimas semanas, lamentos por o Pedro Costa estar em Nova Iorque e não sei quê e no top disto e daquilo, sem serem reconhecidos cá ?

    Depois, creio que tratei esta obra assim mesmo, por si só. Vê bem os elogios que lhe traço. Uma produção fenomenal, uma realização exímia, um argumento interessantíssimo e que cumpre bem aquilo a que se propõe.

    A questão é que, a meu ver, 1) adequa-se bastante a comparação; 2) ao comparar estou a dar mais um ponto à produção deste filme que, ainda assim e como disse, vale por si só.

    Adequa-se bastante porque mostra que não conseguimos levar as pessoas ao cinema, cá e no mundo, não por falta de dinheiro ou preconceito do estrangeiro, mas sim por falta de ideias e de visão nesse sentido. E nem vou discutir o que é "não ter visão nesse sentido" ;)

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  3. Não posso deixar de concordar com o Diogo. Apesar de a minha visão do cinema português, ser bastante idêntica à dele. Creio que neste exacto contexto, em que tens um filme de produção simplicista, uma realização fenomenal e um argumento que é quase meio filme, é que podes despertar a questão polémica, da invalidez das nossas produções. Podes então, a partir daqui, procurar encontrar os pontos de divergência,que fazem desta metragem, uma obra genial, e os que permitem que os filmes portugueses se qualifiquem como estrume. Claro que estaríamos a discutir o sexo dos anjos, se só tivéssemos estes factores em conta mas, ainda assim, serve sempre para despertar. Acima de tudo, para interiorizar que é possível assumir um caminho diferente do da frustração, sendo este
    último, o que caracteriza muitos dos nossos queridos professores, que inevitável e infelizmente, deixam transparecer para as gerações vindouras. Durante a transição de conhecimento. Uma vergonha

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  4. curiosamente, é a crítica que ando a preparar! Ahah antecipaste-te! Muito em breve estará no meu blog.
    Gostei imenso do filme, adianto desde já. Achei o filme muitíssimo bom mesmo.

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  5. Este já está na lista. Quero ver se vale mesmo a pena, mas tenho sérias dúvidas.

    Vou adicionar-te à minha blogrooll, que julgo que ainda não tinha feito x).

    http://cinemaschallenge.blogspot.com/

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  6. já fiz a crítica do filme :P

    http://depoisdocinema.blogspot.com/2011/01/buried-2010_24.html

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