Friday, April 9, 2010

A Clockwork Orange / Laranja Mecânica (1971)


A primeira coisa que me saltou à vista foram os cenários - os que correspondem a algo construído pelo homem, como uma casa. A decoração e configuração da casa de Alex DeLarge (Malcom McDowell, que eu só conhecia de Heroes, como Linderman) e daquela em que o grupo viola uma mulher, que vem, mais tarde, a servir de tecto ao nosso personagem principal, revela a sua impressionante visão futurista. Se me dissessem que era algo actual, acreditaria. Também é verdade que de moda percebo pouco, mas parecia mesmo moderno. A este tratamento vanguardista, deixem-me acrescentar uma nota sobre as filmagens bastante explícitas dos nus. Notem, para tudo isto que acabei de dizer, que já lá vão quase 40 anos.


A isto acresce o facto de ser uma grande história. Anda à volta do tema da violência e do debate filosófico entre a função da sanção, neste caso, a prisão (punição(/retributivismo vs reabilitação), que já vem a ser tratado desde os gregos.


A violência é retratada de uma forma fantástica, numa espécie de comédia sádica – aos actos cruéis (agressão a um velho sem abrigo, bêbedo; violação de mulheres) subjazem as posturas descontraídas e gozonas do grupo (os comentários, as máscaras, os fatos que, noutro contexto, seriam apenas idiotas, o tom de voz de Alex, a música divertida e engraçada que quase nunca pára). Por momentos, é capaz de nos fazer pensar se não estaremos com um sorriso estúpido na cara, a achar graça às maldades que os rapazes vão perpetuando.


A certa altura, DeLarge é traído pelos amigos (os indícios já o faziam prever) e acaba por ir para à prisão, onde a sua postura de “mandrião” autêntico (parece-me uma boa qualificação) é completamente desmontada. Baixa a bolinha e começa a converter-se (talvez esta conversão deve ficar entre aspas, se é que me percebem) à religião. É um claro percurso de lambidela de botas, de uma intencional pseudo-ingenuidade e pseudo-arrependimento, igualmente cómicos. Muito bom.


Às tantas, lá arranja maneira de se submeter ao mais recente tratamento do Ministério da Justiça, que promete curar todo o intento criminal de todo o criminoso, a fim de tornar a sua reinserção na sociedade mais fácil e desejável. É uma autêntica tortura para o personagem e acaba por resultar de forma exagerada e desumana – não consegue suportar violência nem sexo, de forma alguma. Enquanto que, aqui, alguns defendem que se deve seguir com a punição dos criminosos, outros defendem que o caminho é a reabilitação. O tal debate.


A saída da prisão acaba por só trazer mais desgraças. Os seus pais têm um novo “filho”, e praticamente rejeitam o pródigo, é espancado por um grupo de sem-abrigo, é torturado fisicamente pelos colegas traidores (que, na altura, já são polícias) e psicologicamente por um homem que deixou inválido, num dos seus ataques (em que também matou a sua mulher). Notem que isto é tudo de seguida: é espancado, os polícias salvam-no; foge e vai dar com a casa do homem. Esta última travessia é particularmente engraçada, já que o instrumento de tortura é a sua outrora música preferida, a 9ª sinfonia de Beethoven, cujo repúdio foi um dos efeitos secundários do famoso tratamento “Ludovico”.



Eis que chega o final. O Ministro da Defesa, interessado em manter o seu capital político, corrompe o nosso “humilde protagonista” (é, entre outras coisas, assim que ele se apelida, enquanto narra a história), que estava no hospital, após uma tentativa de suicídio, por não aguentar aquela tal tortura psicológica – a imprensa e o povo logo caíram em cima do governo, acusando o seu programa de violação dos direitos humanos. Nos últimos segundos, o Ministro pensa que consegue corrigir a situação, pousando para a comunicação social, num ambiente de cumplicidade, com Alex. No entanto, parece que até a reabilitação tem cura …


Aqui pode entrar uma breve explicação do título (que, confesso, não percebi, quando vi o filme). Basicamente, o homem tem sempre a opção de escolher o caminho do bem ou do mal. Neste sentido, é como uma laranja, um organismo vivo, com cor e sumo. No entanto, Alex é condicionado e forçado a escolher o bem. É nessa altura que se torna uma laranja mecânica. Fantástico.


Uma última nota para os diálogos, que estão brilhantes.


TRAILER

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2 comments:

  1. Olha umas fotos que o K. tirou quando era pequenino: http://nazare-portugal.blogspot.com/2009/01/nazare-vista-por-stanley-kubrick-1948.html

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  2. Simplesmente amei o filme. Acho que Malcom McDowell está absolutamente brilhante! ^^

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